A recente Reforma Tributária (RT) trouxe mudanças significativas para diversos setores da economia, e um dos temas que mais tem gerado discussões é a tributação sobre a locação de bens móveis.
Com a introdução do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), atividades que antes estavam isentas de tributações municipais e estaduais, como a locação, passam a ser enquadradas na nova sistemática. Mas será que as empresas e os municípios estão preparados para essa nova realidade?
O passado: a isenção histórica da locação
Por décadas, a locação de bens móveis esteve fora do alcance do Imposto Sobre Serviços (ISS) e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Essa isenção era justificada por entendimentos jurídicos consolidados. No caso do ISS, a Súmula Vinculante 31 do Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que a locação de bens móveis não poderia ser considerada uma prestação de serviços, pois se trata de uma obrigação de dar, e não de fazer. Já o ICMS, por sua vez, incide sobre a circulação de mercadorias, o que pressupõe a transferência de propriedade. Como a locação envolve apenas a cessão temporária do bem, não havia base legal para sua tributação.
Essa ausência de tributação criou um vácuo fiscal, que, embora benéfico para as empresas do setor, gerava questionamentos sobre a justiça fiscal e a equidade no tratamento de diferentes atividades econômicas.
O presente: a inclusão da locação no IBS/CBS
A Emenda Constitucional 132/23 e a Lei Complementar 214/25 alteraram esse cenário ao ampliar o conceito de operações tributáveis pelo IBS/CBS. Agora, a locação de bens móveis está explicitamente incluída como uma operação sujeita à tributação. Essa mudança representa um marco importante na reforma, pois busca uniformizar a tributação sobre atividades que antes escapavam ao fisco.
O novo sistema permite que operações antes não tributadas, como a locação, sejam enquadradas como serviços, sujeitando-as ao IBS/CBS. Isso significa que as empresas do setor precisarão se adaptar a uma nova realidade, que inclui a emissão de notas fiscais e o cumprimento de obrigações acessórias que antes não eram exigidas.
O futuro: desafios para empresas e municípios
A implementação do IBS/CBS sobre a locação de bens móveis traz desafios tanto para as empresas quanto para os municípios. Para as empresas, a principal mudança será a necessidade de reestruturação de processos internos. Muitas delas, acostumadas à isenção tributária, terão que investir em sistemas de gestão fiscal, treinamento de pessoal e adaptação às novas normas. Além disso, o custo adicional gerado pela tributação pode impactar os preços dos serviços, afetando a competitividade do setor.
Já para os municípios, a questão é como fiscalizar e arrecadar o IBS proveniente dessas operações. Como a locação de bens móveis não era anteriormente tributada, muitos municípios não possuem estruturas adequadas para monitorar essas atividades. Será necessário investir em tecnologia, capacitação de agentes fiscais e regulamentação específica para garantir a eficácia da nova tributação.
E a locação de bens imóveis?
Uma questão que ainda gera incertezas é a tributação da locação de bens imóveis. Embora a Reforma Tributária tenha focado inicialmente na locação de bens móveis, é possível que, no futuro, a locação de imóveis também seja incluída na base de cálculo do IBS/CBS. Isso afetaria diretamente proprietários que utilizam a locação como complemento de renda, como no caso de quitinetes ou imóveis residenciais alugados. A pergunta que fica é: até que ponto a tributação sobre a locação de imóveis seria justa e equilibrada, considerando o impacto sobre os pequenos proprietários?
A Reforma Tributária representa um avanço na simplificação e unificação dos tributos no Brasil, mas já estamos debatendo há algum tempo de que sua implementação exige cuidados. A inclusão da locação de bens móveis no IBS/CBS é um exemplo de como atividades antes isentas passam a ser tributadas, gerando impactos significativos para empresas e governos. Enquanto as empresas precisam se adaptar a uma nova carga tributária e obrigações fiscais, os municípios devem se estruturar para garantir a arrecadação e fiscalização eficientes.
No entanto, é importante que essa transição seja feita de forma gradual e com diálogo entre os setores público e privado. A tributação da locação de bens imóveis, por exemplo, deve ser debatida com cautela, considerando os impactos sociais e econômicos.
A Reforma Tributária é, mais uma vez, um passo importante, entretanto seu sucesso dependerá da capacidade de todos os envolvidos em se adaptar a essa nova realidade.
Claudia Regina Gabriele
Advocacia e Consultoria Jurídica
Referências:
- https://www.contabeis.com.br/noticias/66414/locacao-de-bens-moveis-e-sua-tributacao/
- https://www.portaltributario.com.br/artigos/isslocacaomoveis.htm
- https://www.ibijus.com/blog/736-locacao-de-bens-moveis-tributos-incidentes
- https://www.taxgroup.com.br/intelligence/cbs-ibs-e-is-entenda-os-novos-impostos-que-nascem-com-a-reforma-tributaria/
- https://www.empreendeaqui.com.br/blog/impostos-de-locacao-de-bens-moveis-como-funciona
- https://www.jota.info/tributos/stf-valida-pis-cofins-sobre-locacao-de-bens-moveis-e-imoveis