Impactos da Lei 15.079/24: Desafios e Oportunidades para o Ambiente Tributário e Empresarial no Brasil

A recente promulgação da Lei 15.079/24, que estabelece uma alíquota mínima de imposto de 15% sobre os lucros das corporações multinacionais no Brasil, marca um momento significativo na tentativa do país de alinhar sua política tributária com as diretrizes globais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Embora a adesão a esse padrão internacional seja vista como um passo importante no combate a práticas fiscais agressivas e na promoção de uma concorrência mais justa, o impacto da nova legislação levanta questões substanciais tanto do ponto de vista econômico quanto jurídico, especialmente para o ambiente empresarial no Brasil.

Primeiramente, é necessário destacar a ambição da medida de reduzir o uso de benefícios fiscais estaduais e o uso de ágio em fusões e aquisições. Com a imposição de uma alíquota mínima de 15%, as empresas multinacionais serão obrigadas a ajustar suas estratégias tributárias para garantir que a alíquota efetiva de imposto atinja esse patamar. Para muitas dessas empresas, que tradicionalmente se beneficiam de incentivos fiscais ou regimes diferenciados, como as localizadas na Amazônia Legal ou no Nordeste, essa mudança pode resultar em um aumento significativo da sua carga tributária. De fato, a expectativa de que as empresas possam ter que pagar um “imposto adicional” caso sua alíquota efetiva de imposto seja inferior a 15% é uma mudança que exige uma reavaliação do planejamento tributário, especialmente em setores que dependem fortemente de incentivos fiscais regionais.

Outro ponto de crítica reside na complexidade que a nova lei impõe no cálculo da tributação, pois exige que a determinação do lucro seja feita globalmente, e não apenas no Brasil, o que aumenta a carga de conformidade para as empresas, especialmente para aquelas que operam em várias jurisdições. A medida, ao considerar a receita global para determinar os lucros das empresas, amplia o alcance da regra e cria desafios adicionais relacionados à fiscalização e ao cumprimento das obrigações tributárias. Empresas com estruturas jurídicas complexas, como joint ventures ou holdings, podem enfrentar dificuldades práticas e financeiras para se adaptar a esses novos requisitos.

Além disso, a exclusão de certos grupos, como empresas com grandes folhas de pagamento ou ativos fixos significativos, enquanto exclui os negócios de serviços, incluindo grandes players de tecnologia, cria um tratamento diferenciado que pode ser contestado juridicamente. A jurisprudência brasileira tem sido tradicionalmente sensível a questões de desigualdade e discriminação fiscal, e é possível que o novo regime seja questionado na Justiça, especialmente no que diz respeito ao tratamento distinto conferido a diferentes setores da economia.

Do ponto de vista estratégico, as implicações da nova lei para o mercado de fusões e aquisições (M&A) no Brasil não podem ser subestimadas. O ágio, que tradicionalmente servia como um mecanismo para reduzir a base tributária das transações, pode não ser mais utilizado, tornando muitas operações menos atraentes. A eliminação dessa possibilidade pode afetar diretamente o valor das transações, especialmente em mercados onde as aquisições corporativas têm sido uma prática comum. Como apontado por advogados e executivos, a expectativa de que o ágio não será mais amortizado terá um efeito negativo nas negociações de M&A, reduzindo o apelo dessas operações para as multinacionais.

Por outro lado, pode-se argumentar que a medida tem o potencial de promover uma maior justiça tributária e reduzir a “guerra fiscal” entre os estados brasileiros, que frequentemente concedem incentivos fiscais para atrair empresas. A uniformização da tributação e a imposição de uma alíquota mínima de imposto poderiam desencorajar o uso de paraísos fiscais e ajudar a evitar a transferência artificial de lucros para jurisdições com taxas fiscais mais brandas, prática que tem sido vista como prejudicial à arrecadação fiscal global. Nesse sentido, a adoção do imposto mínimo de 15% alinha-se a um esforço global para garantir que as empresas paguem impostos justos nos países onde realmente geram seus lucros, minimizando a possibilidade de “exportação de receita tributária” para outras nações.

No entanto, o governo brasileiro deve estar atento às possíveis repercussões da medida no curto e médio prazo. O aumento da carga tributária pode levar à redução da competitividade das empresas que operam em setores sensíveis, como o comércio e os serviços, o que poderia ter efeitos negativos no ambiente empresarial no Brasil. As empresas de médio porte, que têm receitas abaixo do limite de 750 milhões de euros, mas são afetadas pelo imposto mínimo global, também podem sentir o peso dessa reforma tributária.

Por fim, a Lei 15.079/24 representa a tentativa do Brasil de aderir aos padrões tributários internacionais e combater práticas fiscais prejudiciais. No entanto, as complexidades de implementação, as distorções potenciais causadas pelo tratamento desigual de diferentes setores e o impacto na economia real exigem uma análise cuidadosa e uma adaptação flexível por parte do governo e dos contribuintes. O risco de sobrecarga tributária, especialmente para as empresas de médio porte, e o impacto nas operações de M&A são questões que requerem uma abordagem mais equilibrada e, possivelmente, ajustes futuros para mitigar efeitos indesejáveis.

Claudia Regina Gabriele
Soluções Tributárias e Jurídicas | OAB/SP 390.898


BRASIL. Portaria PGFN nº 2.044, de 22 de dezembro de 2024. Regulamenta o uso de seguro garantia para débitos tributários.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Portaria nº 280/2024. Institui a Rede Nacional de Tratamento Adequado da Alta Litigiosidade do Contencioso Tributário.

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